Friday, April 29, 2005

25 DE ABRIL SEMPRE, OU QUASE

Só escrevo agora sobre este assunto, pois só agora me apercebo que a generalidade das pessoas julga que as comemorações do 25 de Abril da Avenida da Liberdade foram um êxito, uma vez mais. Nada de mais errado.
Nos últimos dois anos habituámo-nos a ver a Avenida cheia de gente, cheia de cor... e existiam razões para isso... o protesto contra a guerra (ou intervenção, conforme a orientação política), o protesto contra a coligação no Governo, a festa do aniversário dos 30 anos do “25 de Abril”.
Ao contrário, este ano poucas centenas de almas desceram a Avenida... e as que fizeram gritaram baixinho, vibraram pouco, percorreram o asfalto de modo cabisbaixo. As juventudes partidárias passaram mesmo totalmente despercebidas... um exemplo: do líder da JS (certamente seduzido pelo espírito do jovem quadro deputado pois passeava-se de fato e gravata) não se ouviu uma “palavrinha de ordem” sequer.
Assim, quem apareceu da esquerda foi quem tinha de fazer campanha, como Carrilho e mulher (“o melhor do desfile”, segundo a maioria dos porteiros dos hotéis da Avenida), ou aqueles que se mostram inabaláveis na fé pela Revolução; falo de Carvalhas, de Alegre, e de Coelho, e poucos mais.
A ausência de uma multidão não é facilmente explicável, sobretudo se nos lembrarmos que a esquerda portuguesa tem razões para festejar: a maioria no Parlamento, a queda do Dr. Lopes e do Dr. Portas, a proximidade do referendo ao aborto, a liderança do Benfica no campeonato, enfim ... O dia 25 deste mês de Abril nem sequer estava particularmente quente que justificasse uma fuga para as praias. Como se explica a pouco adesão às comemorações?
Avanço com duas teses:
A – os jovens de esquerda encontram-se exaustos de trabalho nos seus novos cargos governamentais. Esta é uma tese curiosa pois é sabido que os jovens sociais democratas e os jovens populares não gostam de trabalhar. Assim, os papeis acumularam-se, as propostas adiaram-se, e agora o jovem quadro socialista tem de duplicar as horas de expediente para fazer o país avançar. Conclusão: os jovens que anteriormente enchiam a Avenida ficaram a gozar o merecido descanso.
B – alguns dos políticos da esquerda parecem já não ter motivos para a manifestação e berraria. Alguns desses supostos estadistas preferem o contentamento desenfreado que antecede um ataque à exaltação de uma vitória feliz. É como o adepto de futebol que explode de emoções quando a sua equipa entra em campo, mas que se silencia ao primeiro golo marcado pelo seu jogador predilecto. É contraditório, bem sei. Mas deve ser por isso que esta tese soa tanto a verdade.

Wednesday, April 27, 2005

CONGRESSO DO CDS/PP

O “Congresso do CDS/PP” teve três curiosidades.

A primeira delas foi o tom do discurso de José Ribeiro e Castro (JRC). Não o primeiro (bom), não o segundo discurso (muito bom), mas sim a linguagem utilizada, o colorido das declarações. Da boca de JRC só saíram palavras raramente ouvidas por parte de um político que pretende ser líder... houve sem dúvida ar novo e fresco quando falou JRC. O novo líder do CDS/PP pautou-se por um discurso ora provocador (mas não arrogante, mesmo quando se referiu a Francisco Louçã) ora brincalhão (mas não patético, mesmo quando justificou que CDS é nome próprio e PP apelido), com técnica jurídica (na distinção entre aborto e "IVG") mas sem ser demasiado incompreensível. Foi um pouco truculento por vezes, mas até nisso esteve bem diferente da clareza televisiva, incisiva mas irritante, característica do anterior presidente do partido.

A segunda curiosidade foi a remodelação de parte do partido, quando poucos estavam à espera que tal acontecesse. A este respeito é interessante notar que após vitória da moção de JRC surgiram vários quadros do partido a integrar as listas para os órgãos do partido, pessoas de quem não se falava. Enquanto as distritais perdiam peso nas listas os quadros do partido que se julgavam desaparecidos da anterior liderança voltavam (vide Comissão Executiva)... muitos deles anteriormente afastados, de uma maneira ou de outra.

A terceira curiosidade é o facto de o CDS/PP ter virado para um “core” ideológico que não se manifestava em anteriores dirigentes destacados. Efectivamente, não se conhecia uma pinga de ideologia “democrata cristã” em dirigentes como Pires de Lima, Nuno Melo ou mesmo no inexprimível João Almeida. A não ser que por ideologia política se entenda para o primeiro “conservadorismo absoluto misturado com fome de mediatismo”, para o segundo “lógica do aparelho”, e para o terceiro “cacique parlamentar”, entre outras características – aliás patentes em todos os partidos representados na AR – que, ainda que importantes para a política (onde chegámos!), não são, contudo, fonte de virtudes.

NÃO SOMOS TODOS ASSIM?

O «(Na) Ferida» surge como a continuação de outro blog, já extinto (faz vários meses) – o «Mexe Na Ferida» - cujo começo foi obra do acaso. Do acaso político, pode dizer-se, o título da página era aliás demonstrativo de alguma voz de protesto; e do acaso da explosão de blogs que então se verificou, também.

Do acaso político, veio o nome e, em bom rigor, a direcção que se tomava. Era uma oportunidade para escarafunchar (era tempo disso – mas não o é sempre? com o que temos!), a infecção era enorme, e escrevemos um pouco sobre tudo o que julgávamos saber criticar. Pouco, mas assim se fez, apontou-se os cambalachos do “ora autarca ora chefe de Governo” Dr. Lopes (a ferida aberta), referimos os zumbidos da sucessão de Ferro Rodrigues (como que uma pequena úlcera que hesita no seu destino), opinou-se sobre a evitável ditadura da RA da Madeira (ai meu Deus que me saem as vísceras!), afrontou-se as palavras vis contra o (também meu) professor Sousa Franco, e falou-se nas outras debilidades mais. Foi o óbvio, bem sei.

Do acaso bloguítico veio o resto: a escrita não politizada, o filme de série B, o livro de cabeceira, o vinho singelo de uma noite bem passada, a música predilecta, a memória de um repasto tradicional, um sonho acordado, um sorriso, uma brisa, uma mensagem camuflada, um relato de viagem. Colocaram-se fotos no blog por isso, copiou-se anedotas pelo mesmo motivo de (me) entreter, deixou-se recados (quase sempre sem destino) e entre linhas de computador deixei (no meu singular) um pouco de mim. Um pouco do meu jeito.

O «(Na) Ferida» surge não do acaso, mas da vontade. É, por isso, muito mais débil, pois a vontade, mais do que o acaso, termina sempre. E é mais suspeito, pois o interesse, muito mais do que o acaso, pode não querer terminar.
Ao tempo dos acasos respeita agora um novo tempo. Vejamos a que sabe este bolo. Como sangra a ferida. «E mexe e remexe...» como dizia o génio...

MEXE NA FERIDA

Para quem tinha saudades

(era eu)...